Notas biográficas
As notas biográficas dos presos políticos que passaram pelo Campo de Concentração do Tarrafal, na Ilha de Santiago, em Cabo Verde, pretendem disponibilizar aos leitores e aos investigadores elementos sobre as suas vidas, com especial relevância para os períodos e as circunstâncias em que nele foram encarcerados pela polícia política do regime de Salazar e Caetano.
Sabemos, no entanto, que nos faltam muitas informações e que os retratos que se apresentam são, quantas vezes, incompletos ou tendo mesmo, eventualmente, incorreções ou omissões que perturbam o seu entendimento.
Com recurso aos arquivos, às obras de memórias, aos familiares, aos estudos, académicos e de investigação, às entrevistas, reportagens e exposições conhecidas, tentámos reunir informação segura e isenta sobre cada um dos presos, acreditando que a sua publicação colmatará lacunas que persistem, contribuirá para aprofundar a visão, individual e global, do que foi o Tarrafal e ajudará ao esclarecimento de muitas questões que ainda permanecem difusas ou sem resposta suficiente.
Permitirá, também, o resgate de todos aqueles que durante trinta anos, de uma maneira ou de outra, passaram por aquele campo concentracionário e que importa não olvidar.
Nasceu em 09-11-1899, em Lisboa. Pedreiro, pertenceu às Juventudes Sindicalistas e à CGT, sendo seu secretário entre 1919 e 1933. Dirigente anarcossindicalista, foi detido em agosto de 1923, inculpado de distribuir manifestos. Com a Ditadura Militar, passou à semiclandestinidade e integrou o comité de ação da CGT que decretou a greve geral revolucionária de 18 de janeiro de 1934. Preso em 11-12-1933, sob a acusação de distribuir explosivos a militantes insurrecionais, seria condenado, em 09-03-1934, a 12 anos de degredo, ficando à disposição do Governo. Seguiu, em 08-09-1934, para Angra de Heroísmo e, em 23-10-1936, para o Tarrafal, onde conheceu a «frigideira», destacando-se na Organização Libertária Prisional e preparou, voluntariamente, as lápides dos que faleciam. Entregue, em 31-12-1945, ao ministério da Justiça. Apesar da pena estar cumprida em março de 1946, continuou encarcerado por lhe faltar pagar vinte contos de multa. Regressou em 10-11-1949 e a liberdade definitiva foi-lhe concedida em 22-11-1952. Após o 25-04-1974, participou no renascer do movimento libertário e na reativação do jornal «A Batalha». Faleceu em 30-11-1998, em Lisboa, com 99 anos.
O segredo das prisões atlânticas
Memórias
Autor: Acácio Tomás de Aquino
Edição: A Regra do Jogo, 1978
Nasceu em 24-09-1896, em Fronteira. Casapiano, desportista, treinador, selecionador nacional, jornalista e Inspetor Superior dos Correios de Lisboa, integrou, durante a 2.ª Guerra, sob as referências «Pax», «H.204» e «H.700», a rede de espionagem inglesa «Shell», criada pelo SOE (Special Operations Executive), tendo a seu cargo a montagem de uma rede de radiotelegrafistas e de grupos de resistência, em caso de invasão de Portugal pela Alemanha. Preso em 01-03-1942, foi espancado e torturado pela PVDE, enviado para Caxias e, em 20-06-1942, seguiu para o Tarrafal, sem julgamento, onde assegurou a transmissão de informações entre os presos e o exterior, por viver do lado de fora do Campo e não estar obrigado a trabalhos forçados. Regressou em 01-01-1944 e levado para o Hospital Júlio de Matos, passou pelo Aljube e Caxias, até sair em liberdade condicional em 27-05-1944. Durante a deportação, a rede secreta por si organizada manteve-se em funcionamento. Fundou, em 1945, o jornal «A Bola», através do qual ajudou ex-tarrafalistas que o procuravam. Faleceu em 23-06-1958, em Estocolmo.
Tarrafal-Pântano da Morte
Memórias
Autor: Cândido de Oliveira
Edição: Editorial República, Lisboa, 1974
Nasceu em 17-04-1907, em São Bartolomeu de Messines, Silves. Carpinteiro em Messines, integrou o núcleo das Juventudes Sindicalistas, militou na CGT e pertenceu ao Sindicato da Construção Civil. Detido em 1932, em Faro, permaneceu seis meses na Cadeia do Aljube, onde conviveu com anarquistas e anarcossindicalistas. Julgado pelo TME em 1933 e absolvido, participou na preparação da greve revolucionária de 18 de janeiro de 1934 na região algarvia, em que não participou por andar fugido. Exilou-se em Espanha e, em Madrid, integrou o secretariado da Federação Anarquista dos Portugueses Exilados. Regressou, clandestinamente, fixou-se em Lisboa e envolveu-se em conspirações reviralhistas. Preso em 05-11-1936, recolheu, incomunicável, à 32.ª esquadra, iniciando o circuito de transferências entre cárceres: 1.ª esquadra (09-01-1937), Aljube (01-03-1937), 28.ª esquadra (03-03-1937), 1.ª esquadra (16-03-1937), Aljube (23-03-1937). Deportado, em 05-06-1937, para o Tarrafal, sem ter sido julgado, passou dezenas de dias na «frigideira», integrou a «brigada brava» e construiu muitos caixões dos que faleciam. Regressou em 20-02-1945, entrou em Caxias e, amnistiado em 07-03-1945, seria libertado em 09-03-1945. Manteve atividade libertária e fixou residência em Almada. Faleceu, em 28-10-1976.
Memória de um prisioneiro do Tarrafal
Memórias
Autor: José Correia Pires
Edição: Edições Dêagá, Lisboa, 1975
Nasceu em 12-02-1901, em Lisboa. Provavelmente, tratar-se-á de Manuel Francisco Rodrigues, «O ação direta», preso durante a I República. Partidário das ideias libertárias e cristãs, viajou pela Europa e, em 1936, estava em Espanha, onde colaborava com os anarquistas e a FAP. Lutou do lado republicano, perdeu a visão do olho esquerdo e, perante o avanço dos nacionalistas, refugiou-se em França, ficando internado nos campos de concentração de Argelès-Sur-Mer, Saint-Cyprien e Gurs. De regresso a Portugal, com passaporte passado pelo Consulado de Toulouse, foi detido no Posto de Beirã, Marvão, em 15-12-1940. Levado para a 1.ª esquadra, seguiu-se-lhe o Aljube (20-12-1940), Caxias (21-02-1941) e Peniche (02-07-1941). Deportado, em 04-09-1941, para o Tarrafal, sem julgamento e a acusação de ser um «perigoso anarquista». Considerando-se vítima de engano, escreveu missivas às diversas entidades, incluindo o Bispo de Cabo Verde, sem qualquer sucesso. Regressou em 20-02-1945 e foi libertado. Fixou-se no Porto e, em 1952, solicitou uma revisão do seu processo para poder lecionar no ensino oficial. Faleceu naquela cidade em 28-09-1977, praticamente invisual.
Tarrafal, aldeia da morte - O Diário da B5
Memórias
Autor: Manuel Francisco Rodrigues
Edição: Brasília Editora, Porto, 03-07-1974
Nasceu em 31-05-1896, em Lisboa. Empregado de escritório. Destacado dirigente anarcossindicalista e da CGT, participou, após o golpe militar de 1926, na reorganização do Conselho Confederal da CGT, sendo eleito responsável do novo secretariado e redator-principal de «A Batalha». Preso em outubro de 1927, seria deportado para Angola no mês seguinte, ficando em Vila Nova de Seles (atual Uku-Seles). Passou, em setembro de 1930, para os Açores e, em 06-04-1931, para a Madeira, participando na «Revolta das Ilhas». Regressou clandestinamente ao Continente e, no âmbito da CGT, integrou o grupo que preparou a greve revolucionária de 18 de janeiro de 1934. Preso em 15-01-1934, foi condenado, em 08-03-1934, a 16 anos de degredo e, em 08-09-1934, embarcou para Angra do Heroísmo. Transferido, em 23-10-1936, para o Tarrafal, desempenhou papel preponderante na organização prisional dos libertários e na sua unificação ideológica, cabendo-lhe, ainda, estabelecer ações convergentes com os comunistas. Sofria, desde Angra do Heroísmo, de patologia intestinal e faleceu em 12-10-1940, com 50 anos, depois de quase duas semanas de sofrimento com febre e sem assistência médica e medicamentosa.
Quatro Anos de Deportação
Memórias
Autor: Mário Castelhano
Edição: Seara Nova, Lisboa, 1975
Mário Castelhano - Esboço biográfico
Memórias
Autor: Manuel Henriques Rijo
Edição: Portal Anarquista
Nasceu em 01-02-1908, em Santarém. Militante do PCP e do SVI desde o início dos anos 30, foi detido, pela primeira vez, em dezembro de 1931. Destacou-se no SVI, contactando os presos, auxiliando as famílias e denunciando as prisões, violências e torturas. Escolhido para representar a Seção Portuguesa no I Congresso Mundial do SVI, realizado em setembro de 1932, em Moscovo, aí permaneceu vários meses e só reentrou em Portugal em 18 de janeiro de 1934. Integrou, em finais de 1935, o Secretariado comunista, chegou a ser responsável pela ORA, envolvendo-se na preparação da «Revolta dos Marinheiros», e manteve-se no apoio aos presos. Detido em 14-04-1937, seria levado para diversas esquadras, esteve no Aljube (27-05-1937) e, em 05-06-1937, seguiu, sem julgamento, para o Tarrafal, onde casou por procuração, seria punido com a «frigideira» e foi ensaiador de noites de teatro. Regressou em 01-02-1946, «precocemente envelhecido pelo sofrimento e com a saúde abalada». Partiu, em 1950, para Moçambique, de onde voltou depois de 25-04-1974. Faleceu em 19-02-1992, com 84 anos. Cunhado de Oliver Branco Bártolo.
Recordações dos tempos difíceis
Memórias
Autor: Miguel Wager Russell
Edição: Edições avante!, Lisboa, 1976