«Fiz parte do primeiro grupo de presos políticos cabo-verdianos, detidos em Cabo Verde, que foram colocados no Campo do Tarrafal, onde, segundo consta numa certidão “fomos entregues” a 26 de Março de 1970, meses depois de o Supremo Tribunal Militar de Lisboa ter agravado as penas a que o Tribunal Militar da Praia nos havia condenado por aquilo que foi classificado por “crimes contra a segurança exterior e interior do Estado” e associação a uma “organização terrorista clandestina” que tinha como objetivo “separar as nossas províncias ultramarinas da Guiné e Cabo Verde da ‘Mãe-Pátria’ por meios violentos e auxílio estrangeiro”.»
«Quando chegámos ao Tarrafal o campo estava dividido em duas secções, uma destinada aos presos políticos acusados de pertencerem a duas organizações nacionalistas angolanas, o MPLA e a UNITA, e a outra, ocupada por presos cabo-verdianos de delito comum, para cumprimento de penas superiores a dois anos.»
«Tendo sido colocados na ala do campo que acolhia os presos condenados por crimes de delito comum, ficámos sujeitos ao regime que lhes era aplicado, agravado pelas medidas adicionais de segurança que a nossa condição de “inimigos do regime” implicava. Os presos de delito comum estavam sob vigilância muito menos apertada.»
«A Pide obviamente exigia às autoridades prisionais o máximo de rigor na prevenção de contactos dos presos com o exterior. Para acompanhar o que se passava no Campo, existia uma dependência da Pide na Vila do Tarrafal que estava, ainda que informalmente, em permanente ligação com o diretor do Campo. Tudo o que entrava na caserna ou dela saía era submetido a apertada vigilância e inspeção detalhada.»